O presidente ausente que leva argelinos às ruas

Iniciado por noticias, 10, Março, 2019, 03:03

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O presidente ausente que leva argelinos às ruas


   Protestos se intensificam contra Bouteflika, muito doente e raramente visto em público, que concorre ao quinto mandato. Estudantes participam de protesto contra a quinta candidatura do presidente Abdelaziz Bouteflika, em Argel, capital da Argélia
Ramzi Boudina/ Reuters
A Primavera Árabe de 2011 que derrubou ditaduras como Tunísia, Egito e Líbia passou ao largo da Argélia. A ameaça de instabilidade foi contida pelo presidente Abdelaziz Bouteflika em troca de generosos subsídios e empréstimos a juros baixos aos argelinos, que ainda guardavam vivas as memórias da guerra contra insurgentes islâmicos, que deixou 150 mil mortos nos anos 90. 
O preço do petróleo caiu, o desemprego subiu, e o presidente de 82 anos candidatou-se ao quinto mandato, embora há cinco anos não apareça em público. Resultado: os argelinos não saem das ruas, nos maiores protestos já enfrentados pelo presidente em 20 anos de governo.
A situação do país e de seu comandante é peculiar. Vítima de um derrame em 2013, Bouteflika está internado desde o último dia 24 em estado grave, na Suíça. Sua candidatura, inscrita por procuração, é mantida, mas poucos acreditam que ele esteja, de fato, à frente do país, incapacitado pela saúde deteriorada e cristalizado no poder por quase duas décadas.
O presidente é comparado a um monarca, apesar do mérito ter encerrado a guerra civil em 2005. As decisões de governo cabem a um grupo, conhecido como Le Pouvoir (o poder), concentrado em generais, políticos e empresários. Said, irmão mais novo de Bouteflika, comanda a coalizão.
Quando os protestos se intensificaram, há duas semanas, o presidente então propôs largar o cargo, mas somente um ano após as eleições marcadas para o próximo mês.
A concessão, porém, não pareceu satisfazer os manifestantes. O movimento para tirar Bouteflika da presidência vem ganhando a adesão de veteranos da guerra da independência (1954-1962), advogados e, sobretudo, dos jovens -- 70% da população têm menos de 30 anos. Destes, 30% estão desempregados.
Os protestos não são apenas sobre Bouteflika ou sobre a economia estagnada pela queda no preço do petróleo. A corrupção e o nepotismo concentrados no clube que governa o país são agentes que alimentam os descontentes.
As manifestações, pacíficas até agora, não garantem o rumo que a tempestade política tomará. O país norte-africano é estratégico para manter a estabilidade numa região de segurança vulnerável. A memória de revoltas recentes na região explica o silêncio de seus parceiros europeus sobre a crise. Entre os países vizinhos, em sua maioria, a democracia sucumbiu após a primavera.
O presidente ausente venceu a última eleição, em 2014, sem a ameaça de opositores. Debilitado pela doença, sequer fez campanha. A junta que comanda a Argélia quer manter o feito na votação de abril e evoca, por meio do presidente moribundo, a trágica lembrança dos anos de guerra civil. O humor dos eleitores, entretanto, é outro.

Arte/G1

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